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De costas para a sociedade, Câmara de São Paulo aprova privatização do saneamento

18/04/2024

  

De costas para a sociedade, Câmara de São Paulo aprova privatização do saneamento

Redação ABCP
Reprodução de textos do Sindicatos dos Engenheiros no Estado de São Paulo e do Sintaema

Em sessão tensa, marcada por protestos e discussões acaloradas entre vereadores, foi aprovado em primeira votação, nesta quarta-feira (17/4), o Projeto de Lei 163/2024, que na prática abre caminho para que o saneamento básico seja privatizado em São Paulo. Foram 36 votos favoráveis e 18 contrários à mudança na legislação que determina a adesão da Capital à privatização da Companhia de Saneamento do Estado de São Paulo (Sabesp), cuja venda já foi aprovada pela Assembleia Legislativa.

Para os defensores da entrega do serviço essencial ao mercado, o passo dado pelo Legislativo municipal é imprescindível, já que a Capital é a principal cliente da companhia, representando 45% de sua receita operacional. Sem a garantia de arrematar esse quinhão, dificilmente a venda da Sabesp atrairia interessados na iniciativa privada.

Derrotada na votação do PL, a oposição ainda apresentou emenda que previa a criação de serviço público municipal para o setor em caso de privatização da companhia que atende a cidade e determinava garantias contra o aumento abusivo dos preços a partir de mecanismos como regras mais específicas para tarifa social. Em nova vitória da base governista, a maioria rejeitou o dispositivo, com o placar de 36 X 14.

Tarifa alta, serviço ruim
Defendida pelo governo estadual e pela Prefeitura, a desestatização do saneamento vem, contudo, sendo criticada fortemente pelos trabalhadores da Sabesp, entre eles os engenheiros, assim como por demais técnicos do setor e por representantes dos movimentos sociais. O primeiro ponto questionado é qual seria a motivação do Executivo paulista para se ver livre de uma companhia cujos resultados são considerados excelentes. Nos 375 municípios em que opera, a empresa já atingiu 100% de abastecimento de água e 90% de coleta de esgoto, com tratamento de 77%. A expectativa é atingir a universalização até 2030, antecipando em três anos o prazo determinado pela Lei 14.026/2020.

Além disso, a Sabesp, que registrou lucro anual de R$ 3,5 bilhões, gera ganhos consideráveis a seus acionistas privados e ao tesouro do Estado. “Nada justifica tamanha ansiedade de entregar ao mercado um ótimo negócio e uma estrutura vital à saúde pública. O risco que se corre, como observado nas várias partes do mundo em que serviços de água vêm sendo reestatizados após o malogro da atuação privada, é a queda na qualidade e o aumento dos preços, tendo em vista o foco na obtenção de lucro”, alertou em artigo nesta semana o presidente do SEESP, Murilo Pinheiro.

Sob o mote “Água não é mercadoria”, os preços abusivos, a falta de investimentos e a queda de qualidade no serviço eram as principais questões pontuadas pelos cidadãos que protestaram ao longo da votação – tanto os poucos que receberam permissão para acompanhar a sessão no plenário quanto os muitos que foram mantidos do lado de fora, separados por grades do acesso a seus representantes.

O exemplo negativo mais próximo é a cidade do Rio de Janeiro, onde, após a privatização da companhia de água e esgoto, o custo elevou-se a um patamar 56,2% acima do cobrado em São Paulo, na estimativa de consumo de 10 mil litros por mês. No caso da tarifa social, a disparidade chegou a 102,4% (R$ 22,38 x R$ 45,32), conforme estudo do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema).

Debate público e recurso à Justiça
A questão também havia sido levantada durante a manhã de ontem em reunião da Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente, da qual participou a diretora do SEESP e engenheira da Sabesp há 30 anos, Fátima Blockwitz. No debate, ela lembrou a importância para a saúde pública do saneamento básico, responsabilidade “que o governo deve assumir”, tendo em vista o direito dos cidadãos ao serviço.

Blockwitz criticou ainda a intenção de aprovar medida de tamanho impacto sem o devido debate com a sociedade, que segundo pesquisa da Quaest divulgada na segunda-feira (15/4), é majoritariamente contrária à privatização. Conforme o levantamento, a medida é reprovada por 61% dos paulistanos e 52% dos paulistas.

Questionamento à privatização
“Um crime contra São Paulo que ataca direitos fundamentais e coloca em risco a vida de milhões, em especial dos mais vulneráveis. A luta segue ocupando as demais audiências e pressionando para que, em segunda votação, a gente consiga virar o jogo”, destacou a direção do Sintaema.

O Sindicato orienta estado de mobilização permanente para seguir na luta em defesa da Sabesp pública e seguirá atuando em outras instâncias para que o direito à água seja respeitado.

Helio Rodrigues (PT) denunciou a interrupção abrupta da discussão do projeto no Congresso de Comissões. “Estamos diante de uma verdadeira aberração”. Para ele, não tem paralelo na história privatizar uma empresa que é competitiva, “que coloca nos cofres públicos do município de São Paulo todo ano R$ 650 milhões”.  Jair Tatto (PT) foi na mesma linha. “Peraí, se a gente privatiza o que dá prejuízo, daí eu topo. Agora, privatizar aquilo que dá lucro, uma empresa que é responsável por 13% de todo o investimento da cidade de São Paulo?”

Exemplos de fracasso
Por outro lado, Luna Zarattini (PT) e Alessandro Guedes (PT) ressaltaram as consequências negativas da privatização dos serviços de água e saneamento no estado do Rio de Janeiro. “Aumentou o número de reclamações, diminuiu o tratamento de esgoto”, denunciou Luna. “No fundo, eles sabem que a privatização não vai melhorar a qualidade da água, não vai ampliar os serviços, nem tampouco vai diminuir as tarifas”. 

Guedes ressaltou que, atualmente a Sabesp cobra R$ 71 por 10 metros cúbicos de água. Na tarifa social, esse valor cai para R$ 22. Já a companhia Águas do Rio cobra R$ 134 – e R$ 60, na tarifa social. “Anotem o nome de quem vai votar contra você e cobrem para que mudem o voto na segunda votação. É isso que tem que acontecer”. E lembrou ainda que Estados Unidos, França, Alemanha e Reino Unido privatizaram os serviços de água e depois voltaram atrás.

“Vai ser nas ruas e no judiciário que a gente vai derrubar isso”, afirmou o vereador Carlos Giannazi (Psol). “Essa Câmara está aprovando como se fosse qualquer coisa um projeto que impacta profundamente na vida das pessoas. A gente está falando do acesso das pessoas à água potável. Tem impacto nas políticas de educação, saúde e habitação. Nunes está obedecendo Tarcísio e impondo esse absurdo completo, por uma razão eleitoral. Somente meia dúzia de acionistas é que vai ganhar com esse processo”, denunciou Luana Alves (Psol). 

Veja os vereadores que votaram contra a sociedade
- Adilson Amadeu (União Brasil)
- Atílio Francisco (Republicanos)
- Aurelio Nomura (PSD)
- Bombeiro Maj. Palumbo (PP)
- Carlos Bezerra Jr. (PSD)
- Cel. Salles (PSD)
- Cris Monteiro (NOVO)
- Danilo do Posto (PODEMOS)
- Dr. Milton Ferreira (PODEMOS)
- Dr. Nunes Peixeiro (MDB)
- Dra. Sandra Tadeu (PL)
- Edir Sales (PSD)
- Eli Corrêa (União Brasil)
- Ely Teruel (MDB)
- Fábio Riva (MDB)
- Fernando Holiday (PL)
- George Hato (MDB)
- Gilberto Nascimento Jr. (PL)
- Gilson Barreto (MDB)
- Isac Félix (PL)
- Janaína Lima (PP)
- João Jorge (MDB)
- Jorge Wilson Filho (Republicanos)
- Marcelo Messias (MDB)
- Marlon Luz (MDB)
- Milton Leite (União Brasil)
- Paulo Frange (MDB)
- Ricardo Teixeira (União Brasil)
- Rinaldi Digilio (União Brasil)
- Rodrigo Goulart (PSD)
- Rubinho Nunes (União Brasil)
- Rute Costa (PL)
- Sandra Santana (MDB)
- Sansão Pereira (Republicanos)
- Sidney Cruz (MDB)
- Sonaira Fernandes (PL)
- Thammy Miranda (PSD)
- Xexéu Tripoli (União Brasil)