NOTÍCIAS
* Sérgio Mateus Fontes trabalhou na UCP I e II (coque) de 1987 a 1998 e na UGAV (gasolina de aviação) de 1999 a 2022. Se aposentou em 2022. Tem 35 anos de Petrobrás.
É interessante resgatar um período importante e fundamental dos petroleiros de todo o Brasil, na primeira década do Século XXI, por volta mesmo do ano de 2003, com o primeiro governo do presidente Lula. Um processo que considero decisivo e que tem, de ponta a ponta, a participação do nosso companheiro, já saudoso, Miro.
Nessa época, eu não fazia parte da diretoria do Sindipetro-LP, como os companheiros Satoshi, Sérgio Salgado e o próprio Miro. Mas essa diretoria decidiu em se manter fiel às lutas da Categoria Petroleira e, para isso, não aceitou nenhum tipo de cargo ou posição na estrutura do Sistema Petrobrás.
Considero uma atitude fundamental para não se manter atrelado ao governo e à empresa, ou seja, para manter distanciamento para cobrar as reivindicações e direitos da categoria. Os companheiros queriam preservar a autonomia e independência necessárias da luta sindical.
Todavia, alguns diretores descumpriram essa decisão, o que levou a diretoria à época rachar, como se diz no jargão sindical.
Importante voltarmos um pouco no tempo para lembrarmos que, no Governo FHC, a empresa lançou um projeto prejudicial ao nosso fundo de pensão, a Petros [Fundação Petrobrás de Seguridade Social]. Era o Plano Petrobrás Vida – PPV. Nesse momento, a Federação Única dos Petroleiros (FUP) fazia parte, junto com outras entidades, de um fórum chamado Comitê em Defesa dos Participantes da Petros (CDPP).
O PPV, é bom lembrar, seria uma troca de contrato de todos os participantes da Petros, com perdas. Estaríamos assinando um novo contrato praticamente, e um dos itens nesse novo plano era a perda da paridade de aumentos com o pessoal da ativa, explicitado no Inciso 10, artigo 48. A ideia era achatar o salário da ativa junto com o do aposentado.
Nesse momento, a FUP fez o trabalho dela de proteção do trabalhador e conseguiu, na Justiça, impedir a implementação do PPV, e a Petrobrás acabou desistindo. Mas, no início do primeiro governo Lula, foi criada uma comissão para estudar uma solução para a Petros, ainda não tinha a questão dos PEDs [Planos de Equacionamento], dos pagamentos. A informação era que estava ocorrendo um déficit no fundo.
A FUP integrou essa comissão e, à época, todos éramos FUP. Então, nesse momento, a comissão tinha a função de fazer a avaliação da Petros e apresentar um plano de recuperação do fundo. Esse plano ficou conhecido como repactuação da Petros, que, em última instância, era quase uma reedição do PPV do governo FHC, mas com outro nome. Era basicamente a mesma coisa do Petrobrás Vida que conseguimos impedir a implantação na Justiça lá atrás.
Foi nesse momento que entendemos a necessidade de um novo movimento de organização para defender os direitos da categoria – da ativa e aposentados. Porque se era o mesmo plano, não tínhamos como defende-lo agora. Nesse sentido, percebeu-se que a federação já não estava focada na defesa dos direitos da categoria, mas sim em aceitar a proposta do governo, mesmo que fosse praticamente a reedição do PPV da época do governo FHC.
Foi nesse contexto que se deu a eleição da nossa chapa no Sindipetro-LP, em 2006. Os aposentados estavam revoltados, e com toda a razão, com a postura de serem praticamente “largados” no caminho. E a nossa base tinha [e tem] muitos aposentados e pensionistas filiados ao nosso sindicato. Entendeu-se a importância de se romper com a sequência de diretorias ligadas à FUP para tomar alguma atitude ao que estava sendo feito. Foi um processo eleitoral, não podemos nos esquecer, bastante conturbado e muito fora dos padrões de eleições anteriores.
Ganhamos, e é quando me torno diretor do Sindipetro-LP e pude acompanhar mais de perto todas as movimentações políticas da federação. Sem dúvidas, foi um processo doloroso para todos, ninguém, em sã consciência, gosta ou torce para divisões nas lutas sindicais. Mas a situação realmente se tornou insustentável para quem queria fazer um sindicalismo de base e que só tivesse como objetivo defender os interesses de toda a categoria, ou seja, a ativa, os aposentados e as pensionistas.
O Miro foi fundamental nesse processo todo, ele não queria fechar as portas com a federação, apenas criar um ambiente democrático e respeito. Mesmo com tudo o que estávamos passando, ainda tentamos de todas as formas participar das instâncias e reuniões da FUP. Mas aí foram feitos processos de expulsão de sindicatos que não se alinhavam à linha da direção da federação, especificamente dos Sindipetros de Sergipe e do Amazonas.
Foi tocada essa expulsão. Nesse momento, tivemos muitas ações que comprometeram qualquer postura democrática. Eles sabiam que no Confup [congresso nacional da FUP] eles perderiam algumas secretarias, mas não a presidência nem o maior número. Não teríamos participação assegurada no congresso mesmo como diretoria eleita.
Todo esse processo de ruptura com a FUP não tinha nada a ver com egos, mas com a defesa dos direitos da categoria. Queríamos, mesmo num governo progressista, manter a independência e autonomia para defendermos os direitos, as reivindicações e combater qualquer tentativa de prejudicar a Categoria Petroleira.
Esse foi o objetivo de toda a movimentação que teve o companheiro Miro à frente. Ele questionou as atitudes e ações da FUP. Esse foi o começo da discussão de uma nova organização nacional dos petroleiros que realmente defendesse a categoria em qualquer governo ou com qualquer diretoria indicada para a Petrobrás. Importante sempre destacar que não éramos oposição ao governo ou a qualquer partido, apenas queríamos nos manter firmes em defesa da categoria. E entendíamos que o único caminho para isso era manter a independência sindical.
Para o Miro, estava evidente que tínhamos de honrar o programa de trabalho e ação que saiu vitorioso na eleição que nos colocou à frente do Sindipetro-LP. Estava fora de cogitação trair esse legado. Por isso, o Miro fez todos os contatos e começou a reunir pessoas que tinham a preocupação de fazer um sindicalismo combativo e de base.
Lançamos a “pedra fundamental” de um novo instrumento de luta, que foi a Frente Nacional dos Petroleiros – FNP. Com discussão na base, inclusive. Era a hora de se implementar uma política robusta e definitiva em defesa dos direitos dos trabalhadores do Sistema Petrobrás que não ficasse refém de governos eleitos e diretorias nomeadas.
O Miro teve essa visão de futuro. Ele foi vanguarda e visionário: não se tem um governo ou uma diretoria para sempre. A política é dinâmica e pode ir para a direita ou para a esquerda, e vimos isso acontecer nos últimos dez anos, pelo menos, no País. Por isso, como entendia Miro, a melhor forma de fazer sindicalismo é junto com os trabalhadores sempre, sindicalismo independente, sindicalismo com autonomia. Para cobrar à direita ou à esquerda, os nossos direitos.
A minha reverência ao grande e saudoso companheiro Miro.
Miro presente, hoje e sempre!